Credor de uma insolvência com recibos verdes

Este post teve origem numa pergunta de um trabalhador despedido.


“Sou ex-trabalhador ou prestador de serviços de uma empresa que ficou insolvente.

Como sou ‘prestador de serviços’, a ‘recibos verdes’, o meu crédito laboral não foi reconhecido pela empresa.

Tive de instaurar uma ação no Tribunal do Trabalho para ser reconhecido como trabalhador efetivo da empresa.

O Tribunal do Trabalho reconheceu-me como trabalhador, apesar de a empresa só me considerar prestador de serviços.

No entanto, a empresa recorreu para a Relação, e ainda não foi decidido o recurso.

Eu reclamei este crédito como crédito laboral, portanto privilegiado.”


Pergunto:

> Este meu crédito reclamado é crédito laboral?
> É reconhecido como efetivo ou condicionado?
> Tenho direito a voto na assembleia de credores?
> Este recurso para a Relação é considerado extinto?

 

Quanto à envolvente:

Historicamente, os direitos dos trabalhadores foram tão espezinhados que agora a legislação protege-os sempre acima de tudo.

Os papéis assinados pelo trabalhador e os seus recibos verdes não se sobrepõem à realidade, que será o facto de o trabalhador ser na realidade um trabalhador dependente daquele emprego, da empresa e daquele salário.

Nestes casos pressupõe-se sempre que o trabalhador estaria em situação económica desesperada, e aceitou assinar tudo o que a empresa lhe colocou à frente, por forma a conseguir um emprego e assim o seu sustento.

Os ditos “falsos recibos verdes” são uma ilusão e um auto-engano dos empresários, porque no fim os trabalhadores vão para tribunal e ganham sempre. É sempre preferível os “patrões” fazerem um contrato a prazo. Assim no fim não haverá surpresas.

Por fim, se existiu recurso da decisão, a decisão ainda não tem força de lei.


Quanto às perguntas:

Regra geral, um crédito tem de ser reconhecido pelo devedor, pelo credor e pelo administrador.

Em casos de pequenas divergências, faz-se uma audiência e o juiz decide o valor do crédito.

Se não se chegar a acordo sobre o valor do crédito, o credor terá que colocar uma ação autónoma contra o devedor para decidir o valor da dívida. Essa ação correrá apensa ao processo de insolvência.

No entanto, o processo de insolvência prossegue, sendo atribuído ao crédito um valor provisório, apenas para efeitos de votação do plano. Este valor provisório pode ser alterado de assembleia para assembleia, não é definitivo, nem constitui sentença judicial.

O valor é atribuído provisoriamente função da evolução do caso e da probabilidade que o juiz “sente” de que venha a verificar-se o crédito em causa.

O valor provisório é uma questão de sentimento do juiz e ponto!

A classificação será sempre a de crédito “privilegiado”, pois tem origem em trabalho.

Se o Tribunal do Trabalho e a Relação não vierem a considerar o trabalhador como efetivo da empresa, o crédito desaparece.

Se mesmo assim existirem dívidas para com o trabalhador dos “recibos verdes” emitidos e ainda não recebidos, esse crédito será comum.

Enquanto existir uma ação no Tribunal do Trabalho para reconhecer o crédito, esse crédito é considerado como estando condicionado à decisão do Tribunal do Trabalho.

Mas ainda assim tem sempre direito de voto, com os votos que o juiz “sentir” que o crédito do trabalhador provavelmente vale.

O recurso e o processo principal só seriam extintos se a empresa fosse encerrada por “insuficiência de massa”, ou seja, se não existirem bens suficientes nem para pagar as custas do tribunal.

Porque a sua continuação é inútil.

 

 

João PM de Oliveira

Consultor na R€-estruturação de Passivos

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