Compensação de contas numa insolvência ou PER

Um encontro de contas: é esta a exigência habitual dos fornecedores ao gestor que acaba de apresentar a sua empresa à insolvência ou a PER.

Muitos fornecedores sabem que são insignificantes num processo de insolvência. De facto, quer a empresa insolva ou apresente um qualquer tipo de plano de recuperação do estado de insolvência, os fornecedores ficam sempre atrás dos bancos e muito atrás dos trabalhadores, nada recebendo.

Mesmo no caso de a empresa ser viabilizada, geralmente sofrem pesados perdões nos seus créditos, pelo que qualquer acordo de compensação de créditos é bem-vindo.

Mas… devem compensar-se as contas?

 


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A compensação de contas entre o fornecedor aflito e o devedor insolvente não é ilegal de per si, mas a forma como se concretiza costuma ser ilegal, pelo que pode originar processos-crime e conduzir a uma insolvência culposa, com o gestor a indemnizar os seus credores.

 

Temos de distinguir duas situações semelhantes:

  1. – Quando o devedor está em PER aplica-se o art. 17º-E, nº 3
  2. – Em insolvência a regra está estampada no art. 99º CIRE

 

Em ambas as situações a regra simplificada é a seguinte:

  • Créditos antigos podem compensar com créditos antigos
  • Créditos novos compensam com créditos novos
  • Créditos antigos não compensam com créditos recentes

As diferenças surgem quando se pretende compensar créditos anteriores ao processo com créditos que surgiram depois de iniciado o processo, seja ele de revitalização ou de insolvência com recuperação.

 

  • Em insolvência com gestão controlada

Neste caso o art. 99º do CIRE determina claramente que é expressamente proibido compensar créditos antigos com novos créditos, é proibido compensar créditos antigos ainda não vencidos com créditos antigos já vencidos.

Apenas o Administrador da Insolvência pode decidir eventuais compensações, pelo que os poderes de gestão corrente dos anteriores gestores não incluem este tipo de decisões. Deste modo, qualquer ação à revelia do Administrador da Insolvência é nula, anulável, condenável e punível com condenação em dolo.

 

  • Em PER com gestão corrente pelo devedor

Em PER o devedor continua a gerir quase livremente a sua empresa, em tudo o que seja gestão corrente.

No entanto, o art. 17º-E, nº 2 do CIRE proíbe os gestores de praticar “atos de especial relevo” sem antes consultar o Administrador Judicial provisório (AJP).

Assim, uma aparente liberdade total de gestão fica condicionada a dois artigos do CIRE:

  1. O art. 17º-E, nº 3, determina que os “atos de especial relevo” têm de ser autorizados pelo AJP e por escrito, não verbalmente;
  2. O art. 161º, nº 1, do CIRE, descreve uma lista de atos que são considerados de especial relevo, mas esta lista não é taxativa, nem fechada, mas sim aberta a interpretação restritiva.

 

  • Comparando as duas situações:

Em ambos os casos, PER ou plano de recuperação, o gestor deverá consultar o AJP sempre que quiser vender ou pagar a algum fornecedor de forma não convencional e distinta das práticas anteriores ao início do processo.

 

O art. 161º CIRE estabelece algumas regras que aqui interpretamos, mas recomendando a sua leitura:

  • O gestor pode continuar a comprar e a vender os bens que costumava comprar e vender.
  • As condições de compra podem ser alteradas, nomeadamente descontos e prazos.
  • Mas não podem pagar contas anteriores ao início do processo sem autorização escrita do AJ,
  • Por outro lado qualquer compra e venda de equipamentos da empresa, independente do valor, está sujeita à aprovação do AJP.
  • Ou seja, a compra e venda de tudo o que não seja matérias-primas, mercadorias e stocks tem de ter autorização do AJP.

 

Portanto, apesar de apenas em processo insolvência o gestor estar formalmente proibido de fazer qualquer encontro de contas, e em PER o gestor estar livre de fazer encontros de contas, esta liberdade está limitada a atos de gestão corrente, que não devem ultrapassar os limites descritos no art. 161º do CIRE, sem antes obter a autorização expressa, por escrito, do AJP.

 

  • Mas afinal qual é o limite na prática?

Existem dois limites importantíssimos que separam a gestão corrente da gestão excecional:

  1. O mais importante é o bom senso e a boa-fé, não privilegiar uns em detrimento de outros.
  2. O art. 161º, nº 3, CIRE, estabelece 10 mil € como limite máximo.

 

Para ultrapassar estes limites, o gestor tem sempre de consultar o AJP.

Note-se que a falta de resposta escrita do AJP é uma recusa formal e incondicional, nos termos do art 17º-E, nº 5, CIRE.

 

Então, o que é um negócio RELEVANTE?

– É relevante quando alguém alterar a sua opinião
sobre a credibilidade das contas ou a gestão da empresa,
ou se o negócio alterar a vontade de aprovar ou reprovar um plano.

– O art. 161º ex vi art. 17º-E, nº 2, CIRE,
lista exemplos de negócios relevantes,
e coloca a fasquia da relevância nos 10 mil€.

 

Exemplo :

  • Compensar 10.000€ a um empresário em nome individual aflito e a passar dificuldades, eu compensava.
  • Compensar 10.000€ a uma grande empresa em que o Administrador não está em dificuldades extremas, … não é recomendável!

 

E se o gestor compensar créditos à revelia do AJP, quais as consequências?

O que é DOLO no contexto de uma insolvência?

 

Planos de recuperação

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João PM de Oliveira

Estratégias na R€-estruturação de Passivos

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