O Código do Trabalho sobrepõe-se ao CIRE, nos termos dos arts. 277º CIRE e 347º do CT.
Assim, se um trabalhador não reclamar os seus créditos de trabalho num processo de recuperação por via de um PER ou um qualquer outro plano de recuperação, apenas fica impedido de intervir no processo.
No entanto, como o CIRE não se sobrepõe ao CT, um plano não pode decidir sobre os créditos de um trabalhador sem o seu consentimento e acordo.
Portanto, terminado o processo de insolvência, o trabalhador pode voltar a exigir os seus créditos que não tenham ficado regulados no plano.
Acresce que se o plano quiser regular os créditos dos trabalhadores, deverá respeitar algumas regras muito apertadas.
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Acórdão: Créditos de trabalho não reclamados mantêm-se depois do plano
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
SUMÁRIO:
I – Inexiste, qualquer violação do caso julgado, não se verificando, por outro lado, qualquer efeito preclusivo, pela circunstância de o Autor não ter reclamado no processo de insolvência, parte do seu crédito, vencido antes da declaração da insolvência da recorrente, uma vez que nada o impede, após o encerramento daquele processo, de exercer o seu direito em acção proposta contra a Ré, que entretanto iniciou a sua actividade.
II – Da interpretação conjugada dos artigos 90º, 217º, nº 1, alíneas a) e c) e 233º, nº 1, todos do CIRE nada impede que o credor possa reclamar, após o encerramento do processo de insolvência, o seu crédito. Se assim não fosse, estaríamos perante uma exoneração do passivo restante implícita, cuja não tem cobertura legal.
III – Sendo a reclamação de créditos um ónus (artigo 128º, nº 3 do CIRE), está na disponibilidade do credor de a fazer ou não. Se a não fizer, ou seja, caso não reclame os seus créditos ou apenas parte deles, a consequência é que tais créditos não podem ser considerados para efeitos de pagamento no processo de insolvência “restando ao credor esperar para exercer o seu direito uma vez encerrado o processo e tornado in bonis o devedor”.
IV – O CIRE não determina que o credor da insolvência que no âmbito do processo de insolvência não reclamou o seu crédito, fique impedido, numa fase posterior, e já fora desse mesmo âmbito, de o fazer em acção própria. A sua inércia não implica a renúncia ao crédito. Ao não reclamar os seus créditos no âmbito do processo de insolvência corre os riscos inerentes a essa mesma não reclamação, já que pode deixar de ter a possibilidade de fazer essa reclamação numa fase posterior.
V – Além do mais devemos levar em consideração que estamos perante um credor, cujos créditos derivam da relação laboral que ainda mantem com a sociedade que se apresentou e foi declarada insolvente. Tais créditos têm, cada vez mais, uma função alimentar, não só do trabalhador, mas também da sua família (cfr. artigo 84º, nº 3 do CIRE), sendo os mesmos, durante a vigência do contrato de trabalho irrenunciáveis. E tanto assim é que os mesmos apenas prescrevem passado um ano sobre a extinção da relação laboral (artigo 337º, nº 1 do Código do Trabalho).
VI – Sendo assim, inexistindo no âmbito do CIRE, qualquer norma impeditiva de que o credor laboral possa numa fase posterior ao encerramento do processo de insolvência reclamar os seus créditos, não vislumbramos, que princípios inerentes a este processo (de insolvência), se possam sobrepor aos princípios reguladores das normas laborais acima elencadas, máxime, que a não reclamação de créditos no âmbito daquele processo determine uma espécie de renúncia dos créditos dos trabalhadores, nomeadamente quando a relação laboral se encontra intacta.
Relator: ANTÓNIO JOSÉ RAMOS
HUB dos Trabalhadores
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João PM de Oliveira
Estratégias na R€-estruturação de Passivos
Consulte também: Extinta a empresa, os créditos de Trabalho não reclamados são inúteis